26 de Maio de 2022 por CADTM
As actividades do CADTM no México entre 26 de abril e 16 de maio de 2022 foram coroadas de sucesso. Mais de mil pessoas participaram presencialmente na dezena de actividades públicas em que delegados/as do CADTM Internacional foram convidados/as a usar a palavra. Estas actividades desenrolaram-se em oito Estados mexicanos (incluindo o distrito federal da capital) [1].
Eis alguns dados sobre a participação do público, lugares e datas dos encontros: 150 pessoas em Oaxaca (capital do Estado de Oaxaca, 500 km a sul da capital), a 26 de abril; 30 pessoas em Toluca (capital do Estado do México), a 27 de abril; 170 pessoas em Cuernavaca (capital do Estado de Morelos, a 100 km do México DF), a 28 de abril, e no mesmo dia cerca de 200 pessoas em Guadalajara (capital do Estado de Jalisco, 500 km a noroeste da capital); 200 pessoas a 2 de maio em México DF no edifício do Sindicato Mexicano dos Electricistas (SME), às quais se juntaram mais de 50 participantes em linha; 30 pessoas a 3 de maio igualmente na capital mexicana, na Praça Santo Domingo; uma centena de pessoas a 6 de maio em Puebla (capital do Estado de Puebla, a 150 km de México DF) em duas actividades diferentes; cerca de 60 pessoas em Mérida (capital do Estado de Yucatan, situada a 1300 km de México DF) a 12 de maio para duas actividades diferentes e cerca de 60 pessoas a 16 de maio em Cancun, situada a 1600 km de México DF, no Estado de Quintana Roo.
Acresce o grande eco dado na imprensa: duas entrevista na versão impressa de La Jornada, principal jornal de esquerda, com várias centenas de milhar de leitores/as e cuja página na Internet recebe mais de 145.000 visitas por dia (as duas entrevistas foram publicadas na página digital de La Jornada, no do CADTM e noutros sítios); um artigo no jornal Sol del Yucatan; artigos na imprensa de Puebla, um artigo no correio dos leitores de La Jornada… Vários vídeos nas redes sociais publicados pelo Sindicato Mexicano dos Electricistas (SME) (ver o programa de rádio do SME – em espanhol – a partir do minuto 40), publicados pela Promotora para a Suspensão do Pagamento da Dívida, etc.
O Governo do presidente Andrés Manuel López Obrador (AMLO), cujo mandato teve início em 2018 e terminará em 2024, prometeu realizar a quarta transformação do México. A primeira transformação corresponde às décadas de independência, que foi conquistada em 1821; a segunda corresponde às reformas liberais e republicanas do terceiro quartel do século 19, sob a presidência de Benito Juárez; a terceira inscreve-se na revolução mexicana que teve início em 1910 e sobretudo no período de 6 anos de mandato de Lazaro Cardenas, de 1934 a 1940. A quarta transformação pretende pôr fim às políticas neoliberais que dominam desde os anos 1980 e retomar e aprofundar o rumo encetado pelas três primeiras transformações [2]. Na opinião de Éric Toussaint, porta-voz do CADTM, a política desenvolvida por AMLO permanece no quadro do modelo capitalista neoliberal. A lógica não mudou, apesar de algumas mudanças positivas que o distinguem dos governos anteriores: o Governo procura combater a corrupção, que grassa no aparelho de Estado, instaurou novos programas de ajuda social, aplicou o direito universal à reforma mas a um nível baixo (1900 pesos por mês, ou seja cerca de 95 euros ou 100 dólares) [3], diminuiu a repressão do Estado sobre os movimentos sociais.
Em matéria de dívida pública, o governo de AMLO adoptou até agora uma política conservadora neoliberal. Embora durante a campanha eleitoral que o levou à Presidência AMLO tenha denunciado o carácter ilegítimo de uma série de dívidas públicas, depois de se instalar no governo assumiu o pagamento das dívidas. Não pôs em marcha uma auditoria da dívida com participação cidadã. A dívida continuou a aumentar. A Promotora para a Suspensão do Pagamento da Dívida Pública apela ao Governo para que efectue uma grande viragem.
O governo de AMLO desenvolve também grandes trabalhos públicos de infraestruturas de comunicação – como o Train Maya ou o «trans-ístmico» (= um corredor de transporte entre o mar das Caraíbas e mais além, até ao oceano Atlântico, por um lado, e por outro o oceano Pacífico na zona do istmo de Tehuantepec) – que são criticados por uma série de movimentos sociais, movimentos camponeses, grupos ecologistas, movimento zapatista, etc.
A violência praticada pelo crime organizado – com a cumplicidade de alguns sectores do aparelho do Estado –, nomeadamente os cartéis da droga, é muito elevada. Uma das formas de violência revela-se no número de vítimas de desaparecimento forçado. Fala-se de 100.000 pessoas desaparecidas desde os anos 1960. Ainda mais inquietante é o facto de o número anual de desaparecimentos forçados ter aumentado nos últimos anos. Segundo La Jornada de 19/05/2022,
«O México ultrapassou a barreira das 100.000 pessoas desaparecidas ou dadas como desaparecidas, segundo os números oficiais comunicados pelo Registo Nacional de Pessoas Desaparecidas (RNPD), coordenado pelo Ministério do Interior. Embora o fenómeno remonte aos anos 1960, época durante a qual os desaparecimentos eram motivados por razões políticas, o aumento massivo reconhecido pelo Governo foi desencadeado pela «guerra contra a droga», lançada em 2006, que está na origem de 95 % dos casos assinalados.
«Considerado pela administração actual como uma crise de direitos humanos, o desaparecimento de pessoas manteve uma tendência crescente, associada – segundo o diagnóstico da Comissão das Nações Unidas para os desaparecimentos forçados (CED) – à presença do crime organizado em diversos Estados, em muitos casos em conluio com as forças policiais, principalmente as do Estado e as municipais. Os dados oficiais corroboram que a causa principal deste problema é o tráfico de droga no México.
«O RNPD dá conta da evolução do fenómeno, relatado por períodos: entre 15/03/1964 e 30/11/2006, foram registados 1988 desaparecimentos de pessoas, principalmente por causa da guerra suja levada a cabo pelo Estado contra os movimentos insurreccionais; a guerra contra o tráfico de droga intensificou o fenómeno, segundo os números oficiais, 16.903 desaparecimentos durante a administração de Felipe Calderón (2006-2012); a continuidade da estratégia contra o crime organizado durante o mandato de Enrique Peña Nieto (2012-2018) foi acompanhada de um aumento de 100 % em relação à época precedente, chegando aos 35.061 desaparecimentos durante os seis anos de mandato.
«Embora o governo de Andrés Manuel López Obrador tenha tomado medidas para criar um quadro jurídico e uma estrutura institucional, a fim de lutar contra esse tipo de crime, e se tenha mostrado aberto à vigilância e à colaboração internacionais, estes esforços foram insuficientes. Os números revelam que apenas em três anos e meio de governo, desapareceram 31.400 pessoas em todo o país.» (La Jornada) [4]
É igualmente terrível a dimensão do feminicídio à escala nacional. Oficialmente, em média 10 mulheres são assassinadas diariamente. Em 2021 apenas 1044 dos 3750 homicídios de mulheres, de meninas e de adolescentes foram classificados como feminicídios.
A cada ano aumenta o número de mulheres assassinadas. Segundo La Jornada, 23/04/2022: «Um fenómeno estreitamente ligado ao feminicídio é o dos desaparecimentos, pois muitas mulheres que não são encontradas acabam por ser casos de feminicídio. O Observatorio Ciudadano Nacional del Feminicidio (OCNF) indicou que, segundo as informações fornecidas pelos gabinetes dos promotores públicos dos 19 estados, “de janeiro a dezembro de 2021, 10.322 mulheres, meninas e adolescentes desapareceram, das quais 2281 continuam dadas como desaparecidas, na sua maioria menores de idade”.» [5]
A isto acresce a violência contra activistas, contra os líderes camponeses, os/as militantes sindicais, incluindo assassínios, geralmente encomendados por latifundiários, grandes empresas, etc.
A Promotora para a Suspensão do Pagamento da Dívida Pública nasceu em 2020. É uma coligação composta por organizações políticas e sociais (entre elas, o Sindicato Mexicano dos Electricistas), assim como pessoas a título individual. Reúne-se semanalmente e organiza regularmente actividades em diversas partes do México.
Foi a Promotora que organizou a dezena de actividades públicas nas quais o CADTM Internacional participou entre 26 de abril e 16 de maio de 2022 (ver o balanço redigido por Benito Mirón e publicado em La Jornada, do qual publicámos cópia em português: http://www.cadtm.org/Mexico-O-pagamento-da-divida-externa-deve-ser-suspenso.
Durante a reunião continental do CADTM AYNA, que teve lugar nas instalações do SME a 29 e 30 de abril de 2022, a adesão da Promotora foi validada com entusiasmo. Nessa reunião participaram delegados da Argentina, Colômbia, Uruguai e Porto Rico, assim como uma delegação do Secretariado Internacional Partilhado do CADTM. A delegação do Haiti apenas pôde chegar ao México a 3 de maio, mas conseguiu reunir com a maioria dos delegados/as do CADTM que ainda estavam presentes na capital mexicana.
O CADTM propôs-se levar a cabo um programa ambicioso para os meses e o ano de 2023: redacção e publicação de um livro sobre a dívida da América Latina e do Caribe; elaboração de instrumentos pedagógicos; realização em 2023 de um encontro com o conjunto de parlamentares da região, a fim de debater as propostas do CADTM em matéria de luta contra as dívidas ilegítimas.
Resumindo, o intenso programa de actividades do CADTM e da Promotora para a Suspensão do Pagamento da Dívida Pública foi coroado de sucesso.
[1] O México é uma federação de 32 Estados.
[2] Ver «Mensaje del presidente de México, Andrés Manuel López Obrador, en el 75° periodo de sesiones de la Asamblea General de la ONU», https://www.gob.mx/inpi/articulos/mensaje-del-presidente-de-mexico-andres-manuel-lopez-obrador-en-el-75-periodo-de-sesiones-de-la-asamblea-general-de-la-onu
[3] Todas as pessoas que chegam à idade de 65 anos têm direito a esta reforma, que é paga através de uma conta bancária do banco público (Banco del Bienestar), que também foi criado pelo governo de ALO. O Governo prometeu aumentar o montante da reforma em 20 % em 2022 e fazê-lo chegar aos 3000 pesos mensais até ao final do seu mandato.
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