16 de Outubro de 2011 por Eric Toussaint
Desde Fevereiro de 2003 é a primeira vez que um apelo a uma acção internacional numa data determinada recebe um tal eco. Em Espanha, donde a iniciativa partiu, perto de 500.000 manifestantes desfilaram nas ruas de cerca de 80 cidades diferentes – dos quais 200.000 ou mais em Madrid [1]. [2] Em 5 continentes se assistiu a acções populares. Mais de 80 países e cerca de um milhar de cidades viram desfilar centenas de milhares de jovens e adultos em protesto contra a gestão da crise económica internacional por governos que acodem em socorro de instituições privadas responsáveis pela derrocada e que dela tiram proveito para reforçar políticas neoliberais: despedimentos em massa nos serviços públicos, sangrias nos serviços sociais e respectivo orçamento, privatizações maciças, atentados contra os mecanismos de solidariedade colectiva (sistemas públicos de pensão de reforma, direito ao subsídio de desemprego, negociações colectivas entre assalairados e patronato, etc.). Por toda a parte o reembolso da dívida pública é o pretexto utilizado para reforçar a austeridade. Por toda a parte os manifestante denunciam os bancos.
Em Fevereiro de 2003 assistimos à maior mobilização internacional para tentar impedir uma guerra: a invasão do Iraque. Mais de 10 milhões de pessoas reuniram-se em inumeráveis manifestações em todo o planeta. Depois disso, a dinâmica do movimento altermundialista nascido ao longo dos anos 1990 abrandou progressivamente, sem no entanto desaparecer por completo.
Neste 15 de Outubro de 2011, manifestaram-se um pouco menos de um milhão de pessoas, mas trata-se duma enorme vitória, porque é a primeira grande manifestação realizada em 24 horas em todo o mundo, contra os responsáveis pela crise capitalista que faz dezenas de milhões de vítimas.
A crise financeira e económica iniciadas nos EUA em 2007 estendeu-se principalmente à Europa a partir de 2008. A crise da dívida, que era coisa dos países em desenvolvimento, deslocou-se para os países do Norte. Esta crise está ligada à crise alimentar que ataca vastas regiões dos países em desenvolvimento desde 2007-2008. Acresce a crise climática que afecta principalmente as populações do Sul do planeta. Esta crise sistémica exprime-se igualmente ao nível institucional: os dirigentes dos países do G8 sabem que não têm meios para gerir a crise internacional, por isso reuniram os G20. Estes por sua vez há três anos demonstram serem incapazes de encontrar soluções válidas. Esta crise adquiriu uma dimensão civilizacional. Pô-la em causa significa pôr em causa o consumismo, a mercantilização generalizada, o desprezo pelos impactes ambientais das actividades económicas, o produtivismo, a procura de satisfação dos interesses privados em detrimento dos interesses, dos bens e dos serviços colectivos, a utilização sistemática da violência pelas grandes potências, a negação dos direitos elementares dos povos, como o da Palestina… Muitas vezes é o capitalismo que está no centro do que é posto em questão.
Nenhuma organização centralista convocou esta manifestação. O movimento dos Indignados nasceu em Espanha em Maio de 2011, após as rebeliões tunisinas e egípcias dos meses antecedentes [e após a espantosa manifestação de 12 de Março em Portugal, que deixou toda a gente de boca aberta ao pôr na rua, num só dia, quase meio milhão de pessoas indignadas, ou seja, cerca de 4% da população portuguesa]. Este movimento estendeu-se à Grécia em Junho de 2011 e a outros países europeus. Atravessou o Atlântico Norte desde Setembro de 2011. Evidentemente uma série de organizações políticas e de movimentos sociais organizados apoiam o movimento, mas não o conduzem. A sua influência é limitada. Trata-se de um movimento largamente espontâneo, jovem na sua maioria, com um enorme potencial de desenvolvimento que inquieta fortemente os governos, os dirigentes das grandes empresas e todos os polícias do mundo. Pode alastrar como fogo num molho de palha, ou morrer em cinzas. Ninguém sabe.
O 15 de Outubro de 2011, o apelo à mobilização, reuniu sobretudo manifestantes dos países do Norte e não poupou os centros financeiros do mundo inteiro, o que é prometedor. O movimento dos Indignados desencadeou uma dinâmica muito criativa e emancipadora. Se ainda não fazes parte, procura juntar-te a ela, ou lançá-la se ainda não existe no local onde vives. Interconectemo-nos para uma autêntica emancipação.
Traduzido por Rui Viana Pereira.
Éric Toussaint, doutorado em Ciências Políticas, presidente do CADTM da Bélgica. Dirigiu com Damien Millet o livro colectivo La dette ou la vie [A Dívida ou a Vida], Aden-CADTM, 2011. Participou no livro da ATTAC Le piège de la dette publique. Comment s’en sortir [A Armadilha da Dívida Pública. Como Escapar], ed. Les liens qui libèrent, Paris, 2011.
[1] Escrevo estas linhas em Madrid, onde participei nesta imponente manifestação de 200.00 pessoas.
[2] Nota do tradutor : Em Lisboa, cerca de 100.00 manifestantes marcharam em direcção ao Parlamento; aí realizaram uma assembleia popular, aprovaram o apelo a uma greve geral do país, a continuação de diversas formas de luta, e um apelo à suspensão do pagamento da dívida e ao arranque de um processo de auditoria cidadã da dívida pública.
docente na Universidade de Liège, é o porta-voz do CADTM Internacional.
É autor do livro Bancocratie, ADEN, Bruxelles, 2014,Procès d’un homme exemplaire, Editions Al Dante, Marseille, 2013; Un coup d’œil dans le rétroviseur. L’idéologie néolibérale des origines jusqu’à aujourd’hui, Le Cerisier, Mons, 2010. É coautor com Damien Millet do livro A Crise da Dívida, Auditar, Anular, Alternativa Política, Temas e Debates, Lisboa, 2013; La dette ou la vie, Aden/CADTM, Bruxelles, 2011.
Coordenou o trabalho da Comissão para a Verdade sobre a dívida pública, criada pela presidente do Parlamento grego. Esta comissão funcionou sob a alçada do Parlamento entre Abril e Outubro de 2015.
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