30 de Janeiro por Yorgos Mitralias

duncan cumming, CC, Flickr, https://www.flickr.com/photos/duncan/53508848315
Já foi dito e escrito muitas vezes que o genocídio dos palestinianos em Gaza é “a primeira guerra transmitida ao vivo” da História. E que, em resultado desta estreia histórica, ninguém pode agora afirmar que não está a par do que acontece na Palestina. No entanto, muito poucas pessoas se perguntaram graças a quem é que esta guerra está sendo transmitida ao vivo. E ainda menos se atreveram a responder a essa pergunta. O que se segue é uma homenagem a todos aqueles que arriscaram a vida para o fazer..
A rede que monopolizou esta transmissão ao vivo chama-se Al Jazeera. E a monopolizou, não porque quis, mas porque a grande maioria dos canais de televisão de todo o mundo se recusou a cobrir “os acontecimentos em Gaza”, ou deixou de o fazer perante as ameaças e as agressões, por vezes assassinas, do invasor israelita, que tudo fez para que não houvesse testemunhas oculares dos seus crimes. Só a Al Jazeera não cedeu e cumpriu a sua missão contra todas as probabilidades, salvando assim a honra tão difamada da imprensa mundial!
Assim, aproveitando o cessar-fogo, que significa que os jornalistas e outros profissionais da mídia presentes em Gaza tiram - finalmente! - seus equipamentos de guerra (capacetes, coletes à prova de bala, etc.) e se sentem a salvo dos drones, obuses e franco-atiradores israelitas, façamos-lhes justiça, fazendo uma primeira avaliação do seu profissionalismo, coragem e heroísmo. Porque é graças a eles que sabemos o que aconteceu nos campos de morte de Gaza e que os carrascos terão um dia de responder pelos seus crimes...
Então, começamos com o extraordinário Hani Mahmoud, o jornalista da Al Jazeera que entrou nas nossas vidas nos acordando todas as manhãs, nos últimos 15 meses, com informações sobre de tudo o que aconteceu em Gaza durante a noite anterior e ao nascer do sol. Hani Mahmoud, sempre de pé, nas ruínas ou em frente de um dos hospitais de Gaza que tinham sido repetidamente bombardeados, contava em inglês impecável e com um rigor exemplar, sem exteriorizar suas emoções, os massacres das últimas horas, enquanto o ruído caraterístico dos drones que sobrevoavam o local por vezes abafava a sua voz e as bombas explodiam frequentemente nas suas costas! E tudo isto enquanto Hani Mahmoud e a sua família partilhavam a sorte dos palestinianos de Gaza, obrigados a vaguear, com fome e sede, de um lado para o outro, sob uma chuva de bombas que os podia atingir a qualquer momento...
https://www.youtube.com/watch?v=zUZYA7yQKbk
Estas bombas atingiram duramente a família de Wael Al-Dahdouh, chefe do escritorio da Al Jazeera na cidade de Gaza, matando a mulher, os filhos e os netos, enquanto ele continuava a nos informar, permitindo-se apenas algumas lágrimas. Mas isso não é tudo. Alguns meses mais tarde, Wael Al-Dahdouh foi alvo de um míssil israelita e, embora tenha escapado com ferimentos, perdeu o seu operador de câmara Samer Abu Daqqa, que morreu instantaneamente. E, para completar a sua tragédia pessoal, o seu filho mais velho, também jornalista, foi morto por um ataque aéreo no início de janeiro de 2025...
Infelizmente, o caso deste grande homem, Wael Al-Dahdouh, não é de todo excecional. Segundo o Comité para a Proteção dos Jornalistas, (CPJ) sediado nos Estados Unidos, “pelo menos 166 jornalistas e profissionais da midiacontam-se entre as dezenas de milhares de mortos em Gaza, na Cisjordânia, em Israel e no Líbano desde o início da guerra, o que faz deste o período mais mortífero para os jornalistasdesde que o CPJ começou a recolher dados em 1992” [1]! [Mas, segundo a própria Al Jazeera, que publicou um inquérito eloquentemente intitulado “Know their names” com as imagens e os nomes dos “jornalistas palestinianos mortos por Israel em Gaza”, o balanço é ainda mais terrível: “De 7 de outubro de 2023 a 25 de dezembro de 2024, pelo menos 217 jornalistas e profissionais dos meios de comunicação foram mortos em Gaza. Outros cinco foram mortos em 26 de dezembro, quando um ataque aéreo israelita atingiu uma van da imprensa perto do hospital de al-Awda. Estes últimos assassinatos de jornalistas sublinham o ambiente perigoso em que os profissionais da comunicação operam em Gaza. Em termos simples, este é o pior conflito jamais vivido pelos jornalistas”. [2]
Sem precedentes na memoria do jornalismo! Uma carnificina sem paralelo na história da imprensa mundial! Para Israel, a eliminação dos jornalistas palestinianos é uma prioridade absoluta, só rivalizada pela eliminação sistemática dos médicos palestinianos. Tanto mais que, desde há muitos meses, os jornalistas palestinianos da Al Jazeera são os únicos que cobrem o genocídio em curso do seu povo por Israel. Porque todos os outros meios de comunicação social jogaram a toalha, salvo algumas exceções [3].
É por isso que basta assistir Al Jazeera algumas horas para perceber que o que todos os outros canais de televisão do mundo fazem ou melhor, não fazem, é simplesmente... desinformação, pura lavagem cerebral. E isto porque a Al Jazeera não fala somente sobre a Palestina ou mesmo sobre o Médio Oriente. Com correspondentes locais (!), cobre toda a gente, desde a Irlanda do Norte e o Botswana até à Indonésia e à Nova Zelândia. E, sobretudo, dá grande importância, com investigações aprofundadas, às grandes questões do nosso tempo, como o feminismo e o estatuto das mulheres, a catástrofe climática e a luta dos movimentos ecológicos, o racismo e o antissemitismo, os direitos e a opressão das pessoas LGBT, a fome no mundo, etc. E sempre do lado dos mais fracos e com os olhos e a sensibilidade dos de baixo, o que leva a Al Jazeera a dar prioridade a todos aqueles que os nossos medias tradicionalmente desprezam e “esquecem”, como a África, os países do Oceano Índico, os da ex-URSS ou... as nações e os povos indígenas. Ao contrário de todos os nossos grandes meios de comunicação, para a Al Jazeera não há vidas ou mortes que contém mais ou menos do que outras, razão pela qual dá muitas vezes a palavra aos familiares dos reféns israelitas detidos pelo Hamas e até a generais e oficiais israelitas que defendem as políticas do governo de Netanyahu! Em suma, fazer coisas que são simplesmente impensáveis não só para os meios de comunicação israelenses, mas também para os principais meios de comunicação dos nossos países ocidentais.
Assim, a nossa conclusão é simples e evidente: para aqueles que queiram formar uma opinião sobre o que é esta Al Jazeera tão odiada por Netanyahu e pelos seus amigos ocidentais e outros, aqui está o link para clicar e seguir as suas emissões em direto: https://www.aljazeera.com/live
| E não deixam de assistir a musica para Hani Mahmoud e o seu colega Tareq Abu Azzoum, composta e cantada pelo Woodie Guthrie de nossos tempos(o judeu americano) David Rovics. https://www.youtube.com/watch?v=fRqe5d5f7Jk |
Tradução: Alain Geffrouais
jornalista, Yorgos Mitralias é membro fundador do Comitê contra a Dívida Grega, organização afiliada do Comitê para a Anulação das Dívidas Ilegítimas (CADTM) e da Campanha grega para a auditoria da dívida.
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