9 de Novembro de 2022 por Scandola Graziani
Inondations au Pakistan, en 2010. - Flickr/CC BY-NC-ND 2.0/Abdul Majeed Goraya/IRIN
Uma compensação financeira permite que os países do Sul financiem sua luta contra o aquecimento global. Mas isto aumenta seu déficit. Neste momento da COP27, alguns estão propondo a abolição de suas dívidas.
Nível das águas subindo, incêndios, ciclones, inundações, desertificação, terras impróprias para o cultivo... Quem pagará a conta? Este é o tema quente na COP27 [1], que foi incluído pela primeira vez na agenda oficial das negociações, dia 6 de novembro sob o título «perdas e danos». Esta é uma pequena vitória para os estados do sul, que estão suportando o peso das consequências da mudança climática. 189 milhões de pessoas por ano são afetadas por condições climáticas extremas nos países em desenvolvimento, de acordo com um relatório intitulado «O Custo do Atraso» pela Loss and Danage Collaboration - um grupo internacional de mais de 100 pesquisadores, ativistas e formuladores de políticas - que foi retomado pela ONG Oxfam. Em 2022, no Paquistão, mais de 1.700 pessoas morreram nas enchentes.
Estes desastres são o resultado de uma crise climática que os países do Sul pouco fizeram para provocar, ao contrário dos países desenvolvidos que são responsáveis pela maioria das emissões de gases de efeito estufa e pela pilhagem dos recursos naturais. Diante do que eles consideram ser uma «dívida ecológica» dos países do Norte, os países do Sul estão exigindo, portanto, um mecanismo de compensação financeira pelos responsáveis. Ajuda específica que cobriria tanto fenômenos climáticos repentinos (enchentes, ciclones, etc.) quanto os efeitos a longo prazo da mudança climática.
Mas até agora, este tipo de ajuda climática não fez a prova da sua eficiência e continua criticável. No relatório «Les faux-semblants des financements climat [A falácia do financiamento climático]», a Oxfam denuncia as falhas do dispositivo de «financiamento climático» lançado em 2009 na COP de Copenhague, o Fundo Verde: trata-se de uma ajuda anual de 100 bilhões de euros pagos pelos países mais ricos (incluindo a França) aos países em desenvolvimento, a partir de 2020, para ajudá-los a enfrentar as mudanças climáticas.
71% deste financiamento é sob a forma de empréstimos
Este financiamento fica aquém das necessidades reais dos países em desenvolvimento, de acordo com Guillaume Compain, o encarregado da campanha clima e energia da Oxfam, «É mais entre 160 e 340 bilhões de dólares por ano que estes países precisarão até 2030». Acima de tudo, ele denuncia o efeito perverso desta ajuda climática, que, em sua maioria financiada por empréstimos, contribui em última instância para aumentar a dívida dos países do Sul: «Na realidade, 71% destes financiamentos são empréstimos, o que é um problema. Isto significa que eles têm que ser reembolsados, muitas vezes acrescidos de juros. Sob o pretexto de ajudá-los a lidar com a crise climática, estamos contribuindo para o endividamento dos países do Sul que já estão sobrecarregados com as dívidas soberanas. Mas a dívida é a melhor aliada do aquecimento global: obriga os países em desenvolvimento a permanecerem no sistema do»tudo para as exportações", da agricultura intensiva e do extrativismo, na esperança de pagar suas dívidas em dólares.
Por que, então, não cancelar as dívidas dos países do Sul em vez de lhes proporcionar uma compensação financeira? Esta é a solução plebiscitada pelo Comitê para a Abolição da Dívida do Terceiro Mundo (CADTM). «Qualquer solução que não consista em cancelar a dívida deve ser descartada», diz Eric Toussaint, presidente da CADTM e autor de vários livros sobre dívidas. «Se quisermos romper com este modelo destrutivo, devemos romper o cordão da dívida».
Uma espécie de extensão da dependência colonial
Ele critica abertamente o sistema de compensação financeira que mantém os países do Sul dependentes do Norte: «Há anos, se fala de fundos de compensação. Já na época de Jacques Chirac, esta era uma política contumaz da França em relação às suas antigas colônias. E podemos ver que não funcionou. Na realidade, é uma espécie de extensão da dependência colonial, pois essas compensações estão muitas vezes ligadas à pressão, ou à obrigação dos países que se beneficiam delas de comprar bens e serviços dos países que concedem essas compensações».
Por serem muitas vezes condicionais, as compensações financeiras apenas alimentam a espiral da dependência Norte-Sul, enquanto mantêm os estados mais vulneráveis em um sistema produtivista baseado em combustíveis fósseis.
Então, qual é o objetivo de financiar ajudas e ao mesmo tempo manter as dívidas? «Estas compensações voltarão de fato para os países do Norte através do pagamento da dívida», salienta Renaud Duterme, autor do livro La dette cachée de l’économie [A dívida oculta da economia], que também trabalhou com o CADTM. De acordo com ele, o risco é «contrair empréstimos para pagar empréstimos». Ele nos exorta, portanto, a permanecer vigilantes sobre a natureza da compensações financeiras negociadas durante a COP27 em Charm el-Cheikh. Por enquanto, fica tudo no limbo.
Artigo inicialmente publicado no site Reporterre https://reporterre.net/Annuler-la-dette-des-pays-du-Sud-une-solution-a-la-crise-climatique?utm_source=newsletter
Tradução de Alain Geffrouais
[1] Do 6 ao 18 de novembro em Charm el-Cheikh no Egito