7 de Outubro por Tatiana Py Dutra

O historiador belga Éric Toussaint (no centro) durante a sua intervenção na reunião preparatória em Porto Alegre. Fotografia: movimentorevista.com.br
Realizou-se uma reunião preparatória da primeira Conferência Internacional Antifascista, que decorrerá em Porto Alegre (no Brasil), em finais de março de 2026. A reunião foi preparada pelo comité organizador da conferência na cidade anfitriã, em 23 de setembro de 2025, e reuniu partidos, movimentos sociais, sindicatos e militantes empenhados na luta contra a ascensão da extrema direita no Brasil e em todo o mundo.
Inicialmente prevista para maio passado, a conferência foi adiada quando o estado de Rio Grande do Sul, de que Porto Alegre é capital, sofreu as piores inundações da sua história. Por essa altura estava prevista a participação no encontro de representantes de 31 países dos seis continentes.
Cerca de dois anos mais tarde, as organizações promotoras, entre as quais o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido Comunista do Brasil (PcdoB) do Rio Grande do Sul, estimam que Porto Alegre esteja de novo em condições de acolher o acontecimento.
O historiador belga Éric Toussaint, figura de proa do movimento altermundialista e participante na conferência, deu o tom internacional da iniciativa. O seu discurso traçou a história do Fórum Social Mundial, que reuniu pela primeira vez em Porto Alegre em 2001 e lançou um alerta sobre a situação actual.
«O grande capital optou em maior ou menor grau pela extrema direita, para derrotar a classe operária, que não constitui a mesma ameaça que representava nos anos 1930, mas que mantém algumas conquistas sociais. O capital quer destruir definitivamente essas conquistas para impor um aumento brutal das suas taxas de lucro Lucro Resultado contabilístico líquido resultante da actividade duma sociedade. O lucro líquido representa o lucro após impostos. O lucro redistribuído é a parte do lucro que é distribuída pelos accionistas (dividendos). .»
Para Toussaint, a unidade entre a esquerda e o campo progressista constitui a única forma de resistir ao neofascismo. O historiador citou várias vitórias recentes, tais como a eleição residencial de Luiz Inácio «Lula» da Silva no Brasil em 2022 e a vitória da Nova Frente Popular nas eleições legislativas francesas do ano passado, exemplos da forma como a mobilização colectiva pode travar a extrema direita. «Quando as forças de esquerda se unem, é possível contrariar a ofensiva da extrema direita», sublinhou.
Toussaint chamou a atenção para o facto de a conferência de Porto Alegre ser um espaço pluralista que reúne toda a gente: sindicatos, partidos de esquerda, movimentos feministas, anti-racistas, ambientais, autóctones e LGBTIQ. O antifascismo deve reunir todas estas lutas, declarou ele:
«A luta antifascista engloba numerosos temas: a rejeição do genocídio em Gaza, a denúncia do negacionismo climático, a resistência aos ataques contra as conquistas das mulheres e da população LGBTQI+, a luta contra o racismo, contra a homofobia e contra o aumento dos gastos militares.»
Luciana Genro, deputada do PSOL do estado de Rio Grande do Sul, sublinhou a importância de Porto Alegre como símbolo dessa coordenação internacional:
«Pela primeira vez na nossa história, o Brasil conseguiu colocar no banco dos réus e condenar um ex-presidente, por tentativa de golpe de estado. Isso é uma vitória democrática importante. Mas ao mesmo tempo sofremos ataques imperialistas, vindos de figuras como [o presidente americano Donald] Trump, que tentam interferir na nossa soberania jurídica. É por isso que precisamos renovar as forças da esquerda e dar respostas de massas, com mobilização e luta.»
Fabiano, representante do Sindijus, sindicato que aglomera os trabalhadores do sector judiciário do Estado, declarou que a situação internacional era grave:
«Trump publicou uma declaração qualificando o movimento antifa [antifascista] como terrorista. A gravidade do que estamos vivendo é gigantesca e isso exige uma capacidade de unidade, superando divergências, porque é o futuro da humanidade que está em jogo.»
Paula, membro da Coluna Vermelha antifascista, afirmou que a luta antifascista deve estar em ligação com os combates das comunidades locais e a solidariedade internacionalista:
«Aqui em Porto Alegre, territórios como o Quilombo Kédi estão sob ataque direto de grandes empresas, como o Zaffari. Assim como em Gaza ou na Venezuela, o capital destrói vidas e territórios. O antifascismo tem que estar na linha de frente dessas lutas e da solidariedade de classe internacional», declarou ela.
Graziela Machado Palma, vice-presidente do Sindisaúde-RS, que representa os trabalhadores da saúde pública do Estado, sublinhou que a resistência se exerce igualmente nos locais de trabalho:
«Vivemos um período muito difícil no Grupo Hospitalar Conceição. A diretoria tem praticado ataques sistemáticos contra trabalhadores… É fundamental discutir o macro, mas também olhar para dentro das nossas bases, porque é nelas que sentimos os efeitos diretos do neoliberalismo e do fascismo.»
A reunião preparatória indicou claramente que a conferência será um espaço pluralista e inclusivo, aberto aos partidos políticos, aos sindicatos, aos movimentos jovens, feministas, anti-racistas, ambientalistas, LGBTIQ e autóctones.
Toussaint sublinhou que «os jovens devem ser os protagonistas» da conferência e esta deve conjugar as grandes sessões plenárias com grupos de trabalho autoorganizados, de forma a facilitar a participação em linha [à distância], a fim de envolver organizações de outros continentes.
Porto Alegre, que já acolheu o nascimento do Fórum Social Mundial, prepara-se para voltar a estar no centro das lutas progressistas mundiais. O apelo é claro: construir uma contra-ofensiva capaz de travar o avanço do fascismo e abrir caminho a um futuro assente na solidariedade, na democracia e na justiça social.
[Tatiana Py Dutra é jornalista na Revista Movimento, onde uma versão deste artigo foi publicada pela primeira vez em português. O artigo foi traduzido para inglês por Federico Fuentes, do sítio internet australiano Green Left, com algumas informações suplementares sobre a conferência e seu contexto.]
Tradução: Rui Viana Pereira