Conselho Internacional do CADTM | Dia 2 | Apanhado global das situações políticas, sociais económicas

4 de Novembro de 2024 por CADTM International , Sushovan Dhar , Omar Aziki , Broulaye Bagayoko , Maxime Perriot , Veronica Carrillo Ortega


Veronica Carrillo Ortega, membro da Iniciativa para a Suspensão do Pagamento da Dívida do México

No dia 8 de outubro de 2024 decorreu a segunda jornada de trabalhos do Conselho Internacional do CADTM. Ordem de trabalhos: situação política, económica, social, estado das lutas na África Subsaariana, na região do Médio Oriente e Norte de África, na Ásia Meridional e na América Latina.



 Africa Subsaariana: Mali, Níger, Burkina Faso, o novo regime

A ajuda ao desenvolvimento dos países do Norte contabiliza os «custos» de acolhimento dos/as migrantes, a formação da polícia de fronteiras, a abertura de centros de detenção de migrantes

Broulaye Bagayoko, secretário permanente do CADTM África, analisou a recomposição política da região. Após três golpes de estado, o Mali, o Burkina Faso e o Níger abandonaram a CEDEAO para formarem a Aliança dos Estados do Sahel (AES). A análise destas mudanças deu azo a um debate no seio do CADTM-África.

Broulaye Bagayoko, do CADTM-África

Broulaye Bagayoko também explanou a influência do Fundo Monetário Internacional na região desde a crise do covid-19:

  • O FMI condicionou um empréstimo à Costa do Marfim condicionado à supressão dos subsídios à electricidade.
  • Pressionou o Governo da Nigéria a suprimir os subsídios aos carburantes: isto provocou um movimento social muito amplo.
Para saber mais: « Afrique : mobilisation sociale au Nigeria »

Broulaye Bagayoko denunciou ainda as políticas desumanas da União Europeia, que levaram à abertura de um centro de detenção no Níger. Insurgiu-se contra a falsa ajuda ao desenvolvimento prestada pelos países do Norte, que contabiliza os «custos» do acolhimento dos/as migrantes, a formação da polícia de fronteiras, a abertura de centros de detenção de migrantes.

Yvonne Ngogi, do CADTM-África

Yvonne Ngogi completou a apresentação sublinhando a situação catastrófica na República Democrática do Congo e o movimento social excepcional que explodiu no Quénia.

Para saber mais: «Solidarity with Kenyan people!»

As acções do CADTM-África em 2024 foram numerosas e de qualidade. Alguns exemplos:

  • O seminário de reforço das capacidades das mulheres em Yaoundé, nos Camarões, que decorreu de 12 a 16 de fevereiro de 2024.
  • A participação no colectivo africano para a justiça climática, com uma animação da temática da dívida climática.
  • O reforço do poder das comunidades em matéria de justiça climática em diversas regiões do Mali.
  • Dois relatórios escritos do Banco Africano de Desenvolvimento.
  • A 4.ª edição da Universidade de Verão do CADTM-África em Abidjan (Costa do Marfim) em julho de 2024.
    Por fim, foram enumerados os principais objectivos do CADTM: entre outros, alargar a base militante, continuar a defender os financiamentos feitos pelo Banco de Africano de Desenvolvimento.

 Médio Oriente e Norte de África: continuam as desigualdades

Omar Aziki, ATTAC-CADTM-Marrocos

Omar Aziki apresentou a situação política, económica e social da região. Destacou uma dezena de consequências da crise ambiental na região: um aumento da temperatura duas vezes superior à média mundial, secas e inundações recorrentes, uma desertificação que avança rapidamente … Deplorou a multiplicação dos conflitos armados e o colonialismo energético que domina a região.

Omar Aziki recordou as diversas intervenções do FMI no Líbano e na Tunísia em 2022 – acompanhadas da exigência de privatização das empresas públicas e da redução da massa salarial no sector público. O Egipto, extremamente endividado, recebeu um empréstimo de 5 mil milhões de dólares do FMI em 2024, como aconteceu em Marrocos um ano antes.

Todos estes países estão presos num modelo extractivista exportador. Exportam recursos mineiros, agrícolas, marinhos, que representam baixos valores acrescentados e que dependem fortemente das flutuações do mercado mundial.

Esta região é a mais desigual do Mundo. Conta com cada vez mais milionários, ao mesmo tempo que o desemprego dos jovens e o trabalho informal são elevadíssimos. Por consequência, a emigração é enorme. A política migratória assassina da Europa fortaleza provocou a morte de numerosos emigrantes da região, em particular provenientes da Síria, do Iraque e do Iémene.

A seguir Omar Aziki analisou as duas vagas revolucionárias que marcaram a região desde 2010:

  • Uma primeira vaga com as Primaveras Árabes em 2010.
  • Uma segunda vaga em 2019, na Argélia, no Sudão, no Iraque, no Líbano e ainda em Marrocos.
    As mulheres e os jovens desempenharam um papel crucial nos movimentos revolucionários.

No entanto, levanta-se uma série de obstáculos a estes projectos revolucionários, como a fraqueza e a falência dos partidos de esquerda, o papel desmobilizador das ONG, o imperialismo ocidental, as instituições financeiras internacionais e as petro-monarquias do Golfo.

A ATTAC-CADTM-Marrocos vai prosseguir a sua luta para promover uma ruptura política onde se conjugue a luta contra o capitalismo, o patriarcado, o imperialismo e o sionismo.

 Ásia Meridional: movimentos revolucionários, autoridade e austeridade

Sushovan Dahr, do CADTM-Ásia Meridional

Sushovan Dhar destacou as desigualdades gritantes que caracterizam a Ásia Meridional. Na Índia, por exemplo, 66 milhões de indianos/as detêm 1 % da riqueza nacional, enquanto o número de milionários explode (actualmente são 119). Mencionou também o movimento Reclaim the Night, nascido após a violação e assassínio de uma jovem médica em Calcutá, em agosto de 2024. Recordou o supremacismo hindu que impera no subcontinente graças a Modi, onde os/as muçulmanos são considerados cidadãos de segunda categoria.

Para saber mais: « En Inde, le viol et le meurtre d’une médecin déclenchent des manifestations »

Sushovan Dhar siblinhou a seguir a enorme influência do FMI na região, para além da Índia. Esta instituição financeira internacional estabeleceu 17 acordos com o Sri Lanka, 25 com o Paquistão. Também emprestou ao Bangladeche em 2022 e 2023. A cada acordo, o FMI impõe cortes nas despesas públicas, abolição dos subsídios aos produtos de primeira necessidade, privatizações, etc. Foi o que aconteceu no Sri Lanka (Ceilão em português), após o movimento revolucionário da primavera-verão de 2022. Nesse país, em setembro de 2024 foi eleito um presidente de esquerda, Anura Kumara Dissanayaka. Quando chegou ao poder, deu o seu aval ao prosseguimento dos acordos assinados com o FMI. No Sri Lanka, até a esquerda radical não se opõe, ou só de maneira extremamente minoritária, ao acordo com as instituições de Bretton Woods.

Para saber mais: «Comrade President? Change and Continuity in Sri Lanka»

O movimento social estudantil no Bangladeche, que levou à fuga do chefe do governo, Sheikh Hasina, também foi alvo de debate.

Para saber mais: « La victoire du mouvement de protestation au Bangladesh »

Mohamed Yunus, conhecido como pai do microcrédito e liberal convicto, preside actualmente ao governo provisório.

Também foram abordados: a crise da dívida no Paquistão, o crescimento do fundamentalismo religioso na região, a participação do CADTM-Internacional no Fórum Social Mundial de Catmandu, no Nepal, em fevereiro de 2024, onde organizou 7 ateliers e conferências.

 América Latina: no México e na Colômbia, que esquerda no poder?

No México, as mulheres não têm títulos de propriedade da terra. Ora os subsídios à produção só são pagos aos produtores que podem provar que são proprietários da terra

Veronica Carrillo Ortega, membro da Iniciativa para a Suspensão do Pagamento da Dívida no México, fez o ponto da situação na América Latina.

Começou por recordar a vitória de Claudia Sheinbaum, primeira mulher presidente do México, que tomou posse no início de outubro de 2024. Ela é membro do partido Morena (Movimento de Regeneração Nacional), tal como o seu predecessor Andrès Manuel Lopez Obrador.

Esta esquerda não tem uma política realmente radical. Aumentou certos apoios sociais mas não avança com transformações de fundo. Recusa, por exemplo, apoiar a transição do modelo de produção alimentar para modos de produção menos intensivos, sem produtos químicos, que não destruam a saúde dos/as consumidores e dos/as produtores. No México, 60 % dos custos dos/as pequenas produtoras agrícolas vão directamente para o bolso das multinacionais que comercializam insumos, adubos químicos, sementes, etc.

A nova presidente não faz por romper com os acordos de livre-comércio assinados com o Canadá e os EUA, ou por corrigir as enormes desigualdades, acentuadas pela inflação, e reabsorver o desemprego jovem.

Veronica Carrillo Ortega explica que esta esquerda não é pressionada pelos movimentos sociais, pois estes, com medo que a direita regresse ao poder, oferecem um apoio passivo Passivo Parte do balanço composta pelos recursos de que uma empresa dispõe (capitais próprios reunidos pelos accionistas, provisões de risco e encargos, dívidas). ao governo. Situação similar à vivida no Brasil, com Lula, que tem políticas de austeridade que contrariam as necessidades da população.

Também sublinhou a dependência do México da importação de milho norte-americano (embora o México fosse um exportador líquido na década de 1970) e das quantidades de dinheiro fabulosas que vão para o reembolso da dívida. 17 % do orçamento de estado vão para o reembolso dos juros da dívida pública. O Estado mexicano gasta muito mais para reembolsar a dívida e pagar os juros do que para o conjunto das medidas sociais.

Veronica Carrillo Ortega explicou que as mulheres desempenham um papel importante na agricultura mas não têm acesso à terra. Esta questão é fundamental, pois os apoios à produção vão para os produtores que podem provar que têm títulos de propriedade. Ora só os homens têm títulos de propriedade.

No campo das lutas, a Iniciativa para a Suspensão da Dívida no México pressiona o Governo mexicano a suspender o pagamento da dívida. Em 1995, o Estado endividou-se enormemente para salvar os bancos. A quantia emprestada já foi reembolsada 4 vezes, mas o Estado continua a pagá-la. Esta dívida deve ser repudiada. O Governo reconhece que esta dívida é odiosa mas apesar disso continua a pagá-la.

Foram abordadas outras situações nacionais:

  • Na Argentina o governo de Javier Milei destrói literalmente o Estado. Os cortes orçamentais afectam todos os sectores, particularmente os da educação. A inflação explodiu desde a chegada do libertariano ao poder.
  • A Colômbia é governada por Petro, que faz declarações radicais, mas privilegia «soluções» perfeitamente compatíveis com os mecanismos de mercado, tais como as trocas de «dívida por natureza».
Para saber mais: «A trapaça da troca de «dívida por natureza» nas Galápagos»
  • Porto Rico, estado dos EUA, que terá eleições ao mesmo tempo que os EUA. No entanto, os/as habitantes de Porto Rico são cidadãos de segunda, pois não podem votar nas eleições presidenciais norte-americanas. Este estado preso a mecanismos coloniais é esmagado pela dívida. A sua população sofre numerosos cortes de electricidade. Estas questões serão centrais nas eleições que terão lugar em novembro.
    Em conclusão: vivemos actualmente, numa parte da América Latina (Brasil, Chile, México, Colômbia, Honduras, etc.) uma segunda vaga de governos progressistas muito menos radicais que a primeira, protagonizada pelos governos de Hugo Chávez, Evo Morales ou Rafael Correa entre 2000 e 2011.

Tradução: Rui Viana Pereira

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Omar Aziki

é membro do Secretariado Nacional de ATTAC CADTM Marrocos e do secretariado internacional partilhado do CADTM.

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Broulaye Bagayoko

membre de la Coalition des Alternatives Africaines Dette et Développement (CAD-Mali) et Secrétaire Permanent du CADTM Afrique (Comité pour l’Abolition des Dettes Illégitimes) Tél : 65 88 11 53/74 90 73 95 e-mail : secretariatcadtmafrique chez gmail.com

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Maxime Perriot

CADTM Belgique

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Veronica Carrillo Ortega

Promotora Nacional por la Suspensión del Pago de la Deuda Pública (México)

CADTM

COMITE PARA A ABOLIÇAO DAS DIVIDAS ILEGITIMAS

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