2 de Abril de 2009
A Assembléia dos movimentos trabalhando sobre o tema da dívida teve lugar no dia 1º. de fevereiro , no quadro da Jornada das alianças do FSM 2009, em Belém.
A Assembléia se desenvolveu com a participação de diferentes organizações e
redes, com
uma forte presença das organizações membros do Jubileu Sul e da rede CADTM
Internacional . Portanto, as conclusões aqui apresentadas refletem a
posição de um
grande número de redes e movimentos contra a dívida, que estão em um
processo de
convergência concretizado pela declaração do FSM de Nairóbi de janeiro de
2007, a
publicação de um boletim comum sobre a dívida ilegítima., a organização
anual de uma
Semana de Ação Global contra a Dívida e as Instituições Financeiras
Internacionais
(IFIS) , a recente realização de um seminário comum de reflexões e
estratégias em
Quito , em setembro de 2008 e a convergência em torno do apoio ao processo e
campanhas
concretas como o desenvolvimento do processo de auditorias.
Os movimentos e campanhas contra a dívida apresentados têm se caracterizado
tal como
a conjuntura atual e os desafios que devemos enfrentar:
1. Apesar de uma propaganda massiva em torno dos programas de anulação
e de
alívio da dívida lançados pelo Banco Mundial e o FMI (PPTE I), PPTE II,
DSRP), pelo G8
(IADM) ou pelos bancos regionais como o BID(Banco Interamericano de
Desenvolvimento)
ou grandes projetos de conversão da dívida, a dívida permanece como um
instrumento
importante de transferência de capitais do Sul para o Norte. O Sul continua
a ser
espoliado, com os níveis de transferências próximos aos 400 bilhões de
dólares anuais.
2. Em paralelo a esta hemorragia , assistimos a um aumento rápido da
dívida
pública interna, que gera uma transferência importante de recursos públicos,
seguindo
os mesmos mecanismos e geralmente controlados pelos mesmos atores que já
se
beneficiam dos fluxos produzidos pelo serviço da dívida pública externa.
Isto agrava
a dependência financeira de nossas economias e de nossos aparelhos
produtivos.
3. A diminuição rápida dos preços das matérias primas estratégicas
sobre o
mercado mundial que acarreta uma redução das receitas dos Estados e a
degradação das
condições que têm permitido o refinanciamento da dívida externa dos países
do Sul
marcados pelos fatores de riscos crescentes anunciam uma nova crise da
dívida. Ela
ameaça a curto prazo os países como a Argentina e o Equador , e a médio e
longo
prazo países como o Brasil e a Venezuela, apesar dos altos níveis das
reservas
internacionais líquidas acumuladas por estes dois países.
4. A crise profunda do sistema capitalista anuncia períodos de
dificuldades
crescentes para os países do Sul e as classes trabalhadoras do Norte. Como
sempre,
medidas e mecanismos institucionais novos serão aplicados para que os
países do Sul e
os pobres do Norte paguem esta crise, gerada pela sede ilimitada de
acumulação e os
processos irresponsáveis de desregulação e de hiper-financeirização do jogo
econômico.
O crescimento dos fluxos para o pagamento da dívida e a pauperização
massiva, o
aumento dramático da quantidade de pessoas vítimas da fome e da subnutrição
em nossos
países, estão como as conseqüências diretas destas estratégias, entre as
quais a
dívida e sua reestruturação representam um papel fundamental.
5. A abundancia escandalosa de liquidez outorgadas pelos governos dos
países
dominantes do sistema contrasta com os recursos de valor insignificante (80
bilhões
investidos cada ano durante 10 anos segundo as Nações Unidas), que são
necessários
para que a humanidade avance de maneira significativa para resolução dos
problemas
sociais os mais agudos( subnutrição, analfabetismo , déficit dos serviços de
saúde
pública e de educação, moradia, etc.). Não podemos permitir que continue
este tipo de
gestão absurda e suicida dos recursos provenientes do trabalho dos Povos.
6. A resposta das classes dominantes dos países do Norte face à grave
crise
atual produz em grande quantidade um reforço do capital financeiro
transnacionalizado e o aumento dos fluxos especulativos. Por exemplo, um
novo mercado
especulativo foi criado em Londres para permitir a venda das emissões de
carbono.
7. A recente eleição de Barack Obama que se manifesta em confusas
esperanças relevantes, não vai mudar nada de substancial na orientação da
política
econômica dos Estados-Unidos. É preciso olhar a composição do gabinete
econômico do
novo presidente, dominado entre outros por personalidades como Paul Volker,
Larry
Summeres e Robert Rubin, que têm representado um papel dominante na montagem
da
política econômica imperialista que desemboca na grave crise atual.
8. A criação do G20, que vem demonstrando toda sua inutilidade no
momento de
resolver a crise , é inaceitável para os nossos Povos. Isto constitue uma
manobra
para dissimular os fundamentos originais da crise e marginalizar um pouco
mais os
Povos do Sul nos espaços de decisão.
1. Assinalamos com satisfação a convergência crescente entre os
movimentos contra a
dívida , que assumem suas divergências mas estão decididas a consolidar uma
plataforma
comum de ações e de lutas.
2. Diante da dívida, nossos movimentos tem obtido avanços muito
significativos
ao nível conceitual, político, ideológico e estratégico. Passamos da
reivindicação do
reescalonamento da dívida para a bandeira da ilegitimidade da dívida,
campanhas
que se concentram sobre a dívida financeira para ações e campanhas que
adotam uma
visão mais ampla integrando as dimensões financeiras, históricas, sociais e
ambientais. Além disso, nossas campanhas realizam mais intercâmbios e
convergências ,
e de melhor qualidade, com as lutas contra o livre -comércio , a
militarização, a
criminalização dos protestos sociais, as transnacionais e os
agro-carburantes, e pela
defesa da soberania alimentar e de nossos territórios.
3. Em 2006, o governo norueguês anulou, de maneira unilateral, uma
parte da
dívida reclamada aos países da América Latina e do Caribe (Equador, Peru,
Jamaica)
assim como a do Egito e da Serra Leão, em reconhecimento de seu caráter
ilegítimo.
4. A linha de trabalho para uma auditoria do processo de endividamento
progride
rapidamente. Aplaudimos a realização da auditoria no Equador. Depois de um
ano de
trabalho , a CAIC (Comissão para Auditoria Integral do Crédito Público)
obteve
resultados impressionantes, demonstrando de maneira magistral o caráter
fraudulento,
ilegal, ilegítimo e criminal da dívida reclamada ao Equador. Apelamos ao
Governo de
Rafael Corrêa para seguir as recomendações da CAIC e a lançar um processo
de
repúdio , que terá incontestavelmente valor de exemplo e de encorajamento
para que os
países do Sul estabeleçam as frentes contra o pagamento da dívida externa.
5. Apoiamos a decisão do Presidente Fernando Lugo de começar um
processo de
auditoria da dívida entre o Paraguay e o Brasil, a fim de criar novas
condições para o
processo de desenvolvimento do Paraguay.
6. Outros países da América Latina se preparam para lançar
procedimentos de
auditorias similares. Eles podem contar com o apoio determinado e entusiasta
dos
nossos movimentos para avançar nesses processos para a libertação da
escravidão da
dívida. As auditorias devem ser empreendidas em uma atmosfera de grande
mobilização
popular.
7. Os processos encorajadores estão em curso em diferentes países e
instancias
regionais. As boas noticias das resoluções do Parlamento Europeu, do
aparelho
legislativo do Zimbabwe e da Bélgica confirmam que vivemos novos tempos ,
com um
início de reconhecimento da violência destrutiva da dívida.
8. Apoiamos a recente decisão tomada pelo Câmara dos Deputados do
poder
legislativo do Brasil, em formar uma Comissão Parlamentar de Investigação
(CPI)
sobre o processo de endividamento do país. É um passo decisivo em direção à
tomada de
posição da auditoria em um dos numerosos países que, tendo pago montantes
impressionantes em reembolso antecipado da dívida e para o serviço da
dívida, a
despeito do sucesso do movimento cidadão para a auditoria que conseguiu
demonstrar ,
graças a um trabalho contínuo desde 1999, as numerosas violações da norma
constitucional e das convenções internacionais na gestão da dívida pública
brasileira.
9. Protestamos contra a escandalosa campanha difamatória dirigia à
nossa
companheira Maria Lúcia Fatorelli pelas classes dominantes do Brasil,
através de
artigos publicados em O Globo , tentando atingir a reputação desta
funcionária
pública, que tem sempre defendido os interesses do povo brasileiro e
realizou um
trabalho admirável no seio da CAIC no Equador. Apelamos a todas as
organizações para
defender a reputação de Maria Lúcia Fatorelli e para proteger os
companheiros e
companheiras internacionalistas que levam seu conhecimento em benefício da
realização
destes processos de auditoria. A verdade sobre as pilhagens de nossas
riquezas pelo
processo de endividamento deve ser tornada pública.
10. Aplaudimos os numerosos esforços fornecidos pelos nossos movimentos
no quadro
da organização de ciclos de tribunais populares, que têm permitido avanços
importantes sobre o plano da caracterização das dívidas ecológicas. As
recentes
edições dos tribunais dos Povos em Viena, em 2006 (Enlaçando alternativas
II), em
Lima ,em abril de 2008, por ocasião do Terceiro Fórum Social das Américas
(FSA III)
na Guatemala , em outubro de 2008 e na Colômbia, têm facilitado a coleta de
uma
documentação impressionante , que coloca em evidência os múltiplos crimes
das empresas
multinacionais contra nossos Povos. Estas atividades, que seguem uma
metodologia
participativa interessante, associadas às recentes lutas dos movimentos
indígenas para
a defesa de Pacha Mama e de seus territórios, constituem assim avanços
altamente
significativos , anunciando vitórias contra o reino da impunidade e para a
proteção
dos nossos bens comuns contra o processo subjugante de mercantilismo do
capitalismo.
1. Apelamos a todos os movimentos para começar um grande processo de luta
sob a
bandeira das reparações , que constituem um instrumento estratégico tendo
por
objetivo aprofundar a luta contra a impunidade e de abrir as vias para
aumentar os
fluxos de recursos e de capitais do Norte em direção ao Sul de nosso
planeta ,no
contexto de um processo firme de distribuição da riqueza a fim de começar a
corrigir
as conseqüências dramáticas de mais de 527 anos de pilhagem.
2. Apelamos a todos os movimentos para colocar em prática uma campanha
ativa contra
o BID, que completará seu 50º. Aniversário, em Medelin, no fim do mês de
março de
2009. Esta é uma excelente oportunidade para podermos afirmar <<50 anos, é
o
bastante>> e para desmascarar as políticas do BID que constituem um dos
pilares do
sistema de dominação imperialista sobre o nosso continente . Na verdade,
eles
promovem , favorecem e desenvolvem projetos , programas e ações conforme a
lógica do
consenso de Washington. Apelamos ao lançamento de um processo de
mobilização contra
este organismo e a realizar numerosos estudos de casos participativos para
permitir a
constituição de dossiês sobre os crimes do BID contra os povos de nossa Abya
Yala.
3. Apelamos aos governos implicados nos projetos do Banco do Sul a acelerar
a
colocação na rota deste novo instrumento institucional ,que deve se
estruturar sobre
uma lógica completamente diferente das regras da atual arquitetura
financeira
mundial ,que está ao serviço dos capitais transnacionais . O Banco do Sul
deve ser um
instrumento a serviço do desenvolvimento de nossos países e de uma
integração
solidária de nossos povos, e deve tornar-se um instrumento estratégico de
recuperação
de nossa soberania financeira . É urgente que sejam superados os obstáculos
que
impedem a concretização de um projeto tão importante para o futuro de
nossos Povos.
4. Apelamos a todos os nossos movimentos a participar na Semana de Ação
Global
contra a crise, o G20 e a OTAN e em solidariedade com o povo palestino que
se
desenvolverá de 28 de março a 4 de abril de 2009.
5. Apelamos a todos os movimentos da América Latina e do Caribe a se
mobilizar para
participar desde o seu país, desde sua região ou diretamente, na importante
Cúpula dos
Povos que terá lugar em Porto Espanha, em Trinidad e Tobago de 16 a 18 de
abril. Esta
conferência internacional deverá ser um momento de reafirmação do que
conquistamos na
ocasião das eleições anteriores de Santiago do Chile em 1998, de Quebec em
2001, e
de Mar Del Plata em novembro de 2005. Aprofundaremos nossos avanços para a
transformação de nossas sociedades (como isto se produz atualmente em
numerosos
cenários nacionais) e nos oporemos a toda a tentativa de parte dos
Estados-Unidos e
de seus aliados, para ressuscitar a Zona de Livre –Comércio das Américas
(ALCA) com
as novas vestimentas e as manipulações conceituais através dos discursos em
torno da
seguridade e da prosperidade hemisférica.
6. Apelamos a todos os movimentos a participar , como nos anos precedentes
, na
Semana de Ação global contra a Dívida e os IFIs que organizaremos de 8 a 15
de outubro
de 2009.
7. Apelamos a todos os movimentos a se solidarizar na luta pela defesa dos
direitos
do Povo palestino e a se mobilizar em particular no dia 30 de março de 2009.
8. Apelamos a todos os movimentos a apoiar a campanha de solidariedade
com o Povo
do Haiti que luta para se libertar da ocupação militar , para obter a
anulação da
dívida externa ilegítima reclamada pelos IFIs e pelo andamento de um
projeto de
reconstrução solidária. Em 2008, numerosas vozes se elevaram para reclamar a
anulação
da dívida exigida ao Haiti a despeito da deterioração das condições de
vida de sua
população (estima-se que mais de 3 milhões de pessoas ali vivem em uma
inseguridade
alimentar crescente).O Haiti continua a pagar mais de um milhão de dólares
por
semana. Recordamos igualmente a importância das lutas pela soberania dos
países da
Caribe que seguem vivendo sob a colonização.
9. Saudamos os sucessos notáveis da Alba , em particular , no domínio da
alfabetização, da saúde e da educação pública. Uma integração solidária para
e com os
o povos pode gerar , em pouco tempo, os resultados qualitativos
impressionantes para a
melhora das condições de vida de nossos Povos. Entretanto, certos acordos
assinados
pelos países formalmente membros da zona da ALBA com os países da América
Central e do
Caribe são desviados de seus objetivos e monopolizados pelas burocracias
corrompidas,
e os benefícios monopolizados pelos grupos oriundos das oligarquias
tradicionais. É
por isto que os Povos devem tomar posse destes instrumentos, que podem ser
os
instrumentos maravilhosos para o investimento social e as pesquisas para
mudar o
modelo energético. Nesta ótica e tal como que se decidiu no momento da 4ª.
Assembléia dos Povos do Caribe , em Cuba, em julho de 2008.Apelamos a uma
melhor
apropriação dos novos acordos para nossos movimentos e convocamos a
organização de uma
Cúpula de Movimentos Sociais do Caribe e da América Central sobre os acordos
O período atual é decisivo para o futuro de nossos Povos e da humanidade.
Devemos impulsionar as lutas de massa crescentes ,que levam em causa os fundamentos
do sistema capitalista. Devemos combater a crise do sistema para que se torne possível
uma saída real em direção à concretização de novos modelos de sociedade. Apelamos a
todos os governos dos países do Sul a constituir rápidamente uma frente ampla contra
o pagamento da dívida. Uma frente que deve oferecer espaços de resistências e
de ofensivas. Os governos dos países do Sul não devem participar na mascarada
do G20 e devem lutar para a emergência de uma nova arquitetura financeira
internacional que responda às necessidades básicas de nossas comunidades , povos , países e
regiões.