12 de Agosto por Paul Martial

Um diola na faina da pesca à rede à beira-mar em Boucotte (Casamance, Senegal)
https://fr.wikipedia.org/wiki/S%C3%A9n%C3%A9gal#/media/Fichier:P%C3%AAche_boucotte.jpg
A escassez dos recursos pesqueiros nas costas africanas resulta das alterações climáticas e, sobretudo, da pesca excessiva praticada em benefício das multinacionais agroalimentares dos países ricos.
Os testemunhos dos pescadores artesanais são unânimes: as capturas estão a diminuir, assim como o tamanho dos peixes. Segundo os peritos, as 51 espécies que povoam os mares africanos — fonte essencial de alimento para as populações — encontram-se hoje ameaçadas de extinção. No Senegal, em apenas cinco anos, o número de sardinelas caiu 80 %. Este pequeno peixe pelágico, muito barato, é um dos principais alimentos da população e faz parte do prato nacional: o thiéboudiène.
A rarefação dos produtos pesqueiros provoca uma profunda inquietação em muitos africanos e africanas. Em vários países ribeirinhos, o peixe representa cerca de metade da nutrição com proteínas animais. Segundo os economistas, a pesca artesanal emprega em África cerca de 12 milhões de pessoas — pescadores/as, peixeiros/as, defumadores, retalhistas.
Os dois principais factores que provocam a diminuição de recursos marinhos são as alterações climáticas e a sobrepesca.
A subida de temperatura não afecta apenas as terras: os oceanos também aquecem, desequilibrando a complexidade dos ecossistemas. As consequências são diversas: desaparecimento dos corais, migração das espécies costeiras em busca de águas mais frias, destruição dos manguezais [1] — um fenómeno particularmente preocupante em África. Frequentemente comparados a viveiros de peixes, os manguezais oferecem abrigo contra os predadores, até que os peixes atinjam a idade adulta. Além disso são adequados à cultura do arroz.
A sobrepesca também tem a ver com o aumento de pescadores artesanais. Em consequência do aumento massivo de desempregados jovens, muitos tentaram a sua sorte nesse sector. Na Serra Leoa, pequeno país da África Ocidental, o número de pescadores/as duplicou em 20 anos, passando de 75.000 a 150.000.
Mas esta realidade não deve mascarar a principal causa do esgotamento de recursos: a pesca industrial. A costa africana é percorrida o ano inteiro por autênticos navios-fábrica que capturam toda a fauna e provocam estragos ecológicos consideráveis.
A regulação pesqueira nas zonas económicas exclusivas varia consoante os países, mas de forma geral é considerada, tanto pelos profissionais artesanais como pelos militantes ecologistas, insuficiente e desrespeitada. Na Serra Leoa uma licença de pesca custa entre 15.000 e 20.000 euros, consoante a tonelagem do barco, e autoriza a pesca durante todo o ano. São frequentes as práticas para contornar a lei: uso de mandatários locais permite aos navios industriais obter direitos de pesca perto da costa, beneficiando assim de isenções fiscais sobre os carburantes e de ajudas para as despesas administrativas e portuárias.
A pesca INN (ilícita, não declarada e não regulada) prospera graças às carências de meios marítimos dos estados africanos, incapazes de vigiar e embargar os navios infractores.
A pesca industrial progride não só para responder à procura ocidental, mas também para alimentar numerosas fábricas de produção de óleo e farinha de peixe.
Cerca de 60 fábricas deste tipo foram erguidas nos últimos anos no litoral da África Ocidental. Resultado: os recursos pesqueiros são desviados do consumo local. A Greenpeace calcula que em cada ano, 500.000 toneladas de peixe são transformadas em farinha. [2] Estas farinhas servem para alimentar peixes de viveiro (atum, salmão) destinados aos mercados europeu e chinês, bem como para alimentar viveiros industriais de porcos.
Fonte: Afriques en lutte.
Tradução: Rui Viana Pereira
[1] Nota do tradutor: O manguezal, ou mangal, é um tipo de sapal das regiões tropicais e subtropicais. O mesmo fenómeno de destruição dos sapais ocorreu na costa portuguesa, não só no Algarve mas por todo o Mediterrâneo, a partir da década de 1960, tendo como consequência não só uma redução drástica dos recursos pesqueiros e de vastos ecossistemas, mas também a falência de numerosas indústrias, entre as quais a até então florescente indústria conserveira. Esta destruição foi feita em benefício dos empreendimentos turísticos e da construção de marinas de luxo.
[2] Greenpeace France, «En Afrique de l’Ouest, le drame du poisson volé», 11/066/2021.
15 de Setembro de 2024, por Paul Martial