Vozes de mulheres pastoras: liderança e resiliência no mês da luta das mulheres trabalhadoras

25 de Abril por Collectif


Leia trechos de contribuições de mulheres pastoras feitas durante webinário realizado em março de 2025 como parte dos preparativos para o 3.o Fórum Global Nyéléni.



Como parte do mês da Luta das Mulheres Trabalhadoras, as vozes das mulheres pastoras ecoaram alto, vindas de diferentes cantos do mundo. A liderança, a resiliência e o profundo conhecimento de seus territórios são essenciais para a sustentabilidade de suas comunidades e dos ecossistemas onde vivem. Em um webinário recente organizado pela Aliança Global de Povos Pastores e Indígenas Nômades (World Alliance of Mobile Indigenous Peoples and Pastoralists — Wamip), Mamankhuu Sodnom, da Mongólia; Megha Sheth, da Índia; Monicah Yator, do Quênia; e Marite Álvarez, da Argentina, compartilharam experiências, desafios e caminhos para fortalecer as mulheres na pastorícia.

Mamankhuu Sodnom, coordenadora regional da Wamip para o Leste Asiático e Ásia Central, apresentou um relato sobre a vida enraizada nas tradições nômades. Pastora e pequena produtora de laticínios há mais de 60 anos, Mamankhuu enfrenta a ameaça premente da expansão das mineradoras que avançam sobre os campos de pastoreio. Essa apropriação de terras ameaça o modo de vida de sua comunidade e, consequentemente, a subsistência de mulheres e famílias que dependem de seus rebanhos. Em resposta a esses desafios, Mamankhuu destaca a necessidade de promover o valor dos produtos da pastorícia e preservar e transmitir saberes ancestrais para gerações futuras, sobretudo para mulheres jovens. Sua colaboração ativa com o governo da Mongólia no marco do Ano Internacional das Pastagens e das Pessoas Pastoras (International Year of Rangelands and Pastoralists — IYRP) destaca a importância de garantir que as vozes das mulheres pastoras sejam ouvidas e consideradas nas políticas que afetam suas vidas.

Do árido ao semiárido de Kutch, na região oeste da Índia, Megha Sheth, integrante da Wamip e da Aliança de Pessoas Pastoras do Sul da Ásia, apresentou um exemplo inspirador de liderança das mulheres na gestão das pastagens comunitárias. Reconhecendo que a pastorícia é mais do que um trabalho — é um modo de vida que oferece soluções para diversas crises —, a Aliança de Mulheres Pastoras Maldhari lançou um projeto piloto em dez povoados. A partir da criação de comitês gestores de pastagens liderados por 110 mulheres pastoras, elas enfrentaram a questão da redução e degradação das terras para pastagem. Essas mulheres receberam formação em mapeamento de terras, liderança, planejamento de desenvolvimento de pastagens e práticas de recuperação sustentável. Os resultados foram impressionantes: lideradas por elas e guiadas por seus saberes tradicionais, enviaram propostas para instâncias locais e garantiram o reconhecimento formal de títulos de terra para 2.080 acres de áreas de pastagem. Além disso, elas implementaram práticas de restauração, como abertura de clareiras, nivelamento de terrenos e plantio de gramíneas nativas resilientes ao clima. Esse esforço coletivo levou à regeneração e restauração de mais de 100 acres de áreas de pastagem, beneficiando mais de 1.020 famílias. A experiência das mulheres pastoras Maldhari demonstra como a liderança das mulheres pode garantir a sustentabilidade ecológica e econômica de suas comunidades e, ao mesmo tempo, promover a governança e o reconhecimento formal de seus direitos sobre a terra.

Da Wamip no leste e sul de África, Monicah Yator, mulher pastora queniana com orgulho e fundadora da Iniciativa de Mulheres e Meninas Indígenas, descreveu as profundas barreiras sócio-culturais que as mulheres enfrentam em suas comunidades, o que fica evidente pela ausência delas em espaços decisórios relacionados aos comuns. Apesar de serem o pilar que sustenta suas famílias — muitas vezes com propriedade limitada de rebanhos —, as mulheres pastoras sofrem com os gravíssimos impactos dos desafios ambientais como as mudanças climáticas e as enchentes, bem como a marginalização política e a falta de representatividade em órgãos de governo. A infraestrutura inadequada em seus territórios impede ainda mais sua capacidade de se conectar e mobilizar. Monicah destacou a necessidade urgente de se construir marcos para políticas que reconheçam e protejam a pastorícia em África, garantindo o uso da terra e os direitos de propriedade. Ela também enfatizou a importância de discutir a resiliência à seca e a adaptação climática a partir de uma perspectiva de gênero, além de melhorar o acesso a serviços sociais e à educação para crianças pastoras. Por fim, Monicah chamou os governos a reconhecerem e apoiarem a pastorícia como um modo de vida e a protegerem os direitos de mulheres pastoras que enfrentam deslocamentos forçados e perda de meios de subsistência em função de conflitos.

Marite Álvarez, representante de organizações pastoras da Argentina e coordenadora regional da Wamip para a América Latina, destacou o aumento das ameaças contra territórios pastores na região em função da intensificação do extrativismo, do agronegócio e do turismo. Ela expressou um forte sentimento de esperança de que 2026, Ano Internacional das Pastagens e das Pessoas Pastoras (IYRP), servirá como momento crucial para tratar desses desafios, incluindo a falta de reconhecimento do valor da pastorícia na América Latina, a ausência de políticas de proteção aos direitos territoriais e a necessidade de haver maior apoio a organizações pastoras por meio de modelos alternativos de desenvolvimento e da visibilidade global de experiências e demandas de pessoas pastoras da América Latina. Ela enfatizou a importância da participação em espaços globais para identificar problemas comuns e garantir que a visibilidade do IYRP se traduza em programas concretos de apoio a organizações e famílias pastoras, reconhecendo sua contribuição para a soberania alimentar, o combate à mercantilização, a garantia de alimentos de qualidade e o acesso a direitos.

O webinário também destacou a importância fundamental da pastorícia para a sustentabilidade do ecossistema, a preservação cultural e a soberania alimentar. Por ser um modo de vida sustentável, resiliente e ancestral, a pastorícia exemplifica a soberania alimentar em ação, mas está sendo cada vez mais ameaçada pelo acaparamento de terras, as mudanças climáticas e as políticas que favorecem o agronegócio. Nesse contexto, o processo do Nyéléni, nascido a partir do fórum de 2007 no Mali, foi mencionado como um farol de esperança para os movimentos que lutam por soberania alimentar. O 3.o Fórum Global Nyéléni, que acontecerá no Sri Lanka em setembro de 2025, foi destacado como um momento-chave para a unidade e a ação popular, inspirando o caminho para o IYRP 2026.

O papel central das mulheres pastoras e de outras pequenas produtoras de alimentos ao redor do mundo é fundamental para a sobrevivência de suas comunidades e a gestão sustentável dos recursos naturais. É crucial garantir seus direitos à terra e a recursos, promover sua liderança e participação em processes decisórios e implementar políticas que reconheçam e valorizem seus saberes tradicionais, assim como suas contribuições para a soberania alimentar e a preservação do ecossistema. Neste mês da Luta das Mulheres Trabalhadoras, as vozes das mulheres pastoras da Wamip nos lembram da importância de amplificar e apoiar sua liderança e resiliência em escala global.

Este artigo foi produzido pela equipe de comunicação do Nyéléni e foi originalmente publicado no site do 3.o Fórum Global Nyéléni.


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