A verdade sobre a «crise da dívida»

6 de Agosto de 2011 por Mark Weisbrot




Já que a «crise da dívida» dos EUA vem recebendo tanto destaque na imprensa, vale a pena esclarecer o que é verdade e o que não é. Primeiro, o governo norte-americano não enfrenta uma «crise de dívida».

O serviço líquido da dívida pública dos EUA equivale a apenas 1,4% do Produto Interno Bruto PIB
Produto interno bruto
O produto interno bruto é um agregado económico que mede a produção total num determinado território, calculado pela soma dos valores acrescentados. Esta fórmula de medida é notoriamente incompleta; não leva em conta, por exemplo, todas as actividades que não são objecto de trocas mercantis. O PIB contabiliza tanto a produção de bens como a de serviços. Chama-se crescimento económico à variação do PIB entre dois períodos.
(PIB) -o que não é muito nem em termos históricos nem na comparação internacional.

O deficit anual comparativamente grande que existe hoje (9,3% do PIB) se deve em larga medida à recessão e à recuperação fraca.
As projeções para o deficit em longo prazo são impulsionadas pelos custos da saúde no setor privado.

Eles influenciam os gastos públicos porque o governo dos EUA cobre quase metade dos custos de tratamentos de saúde, um nível quase duas vezes mais alto que o dos demais países desenvolvidos.

Jamais houve chance real de que os EUA decretassem moratória sobre sua dívida. Toda a «crise» foi fabricada desde o princípio, e os republicanos da Câmara dos Deputados usaram um truque legislativo para conseguir cortes de gastos impopulares que não foram capazes de impor à força pelas urnas.

E o truque funcionou: conseguiram um acordo que promete grandes cortes de gastos sem quaisquer aumentos nos impostos dos americanos ricos e muito ricos, cuja participação na renda nacional aumentou consideravelmente nas três últimas décadas.

A direita venceu porque o presidente Obama escolheu colaborar com ela, também procurando aproveitar a «crise» fabricada para implementar cortes que ofenderam e magoaram as pessoas que votaram nele. É claro que ele desejava elevar os impostos pagos pelos ricos, mas, ao aceitar como legítima a extorsão republicana, saiu derrotado nisso.

O pior estrago causado por essa «arma de distração em massa» -e pela capitulação do presidente Obama diante dela- é que o debate político nos EUA se alterou radicalmente. A falsa «crise da dívida» é vista como o principal problema e, de modo ainda mais absurdo, como causa da fraqueza da economia.

A economia americana mal cresceu neste primeiro semestre, e temos 25 milhões de pessoas desempregadas, trabalhando apenas em tempo parcial a contragosto ou que já desistiram de procurar emprego.

Já andamos um terço do caminho para uma «década perdida», e a virada do debate político na direção da redução do deficit tornará mais provável que percamos mesmo a década toda.

Caso o presidente Obama perca o controle das duas casas do Congresso e/ou a Presidência, na eleição do ano que vem, as causas terão sido a economia fraca, o desemprego alto e o fato de que permitiu que seus oponentes não apenas sabotassem a economia -o que fizeram alegremente- como redefinissem o debate econômico de modo a que o presidente e seu partido levem a culpa pela bagunça.

Assim, da próxima vez que alguém se queixar de que a maioria da América do Sul é governada por presidentes populistas de esquerda que brigam demais com as elites de seus países, lembre-se de que há tipos piores de liderança: por exemplo, o tipo que comete suicídio político em nome do «bipartidarismo».

Tradução de Paulo Migliacci.


Mark Weisbrot, codiretor do Centro de Pesquisas Econômicas e Políticas, em Washington, e presidente da Just Foreign Policy, passa a escrever quinzenalmente às quartas-feiras.

Mark Weisbrot

est codirecteur du Center for Economic and Policy Research à Washington et président de Just Foreign Policy. Il est également l’auteur de « Failed : Ce que les “experts” n’ont pas compris au sujet de l’économie mondiale ».

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