Série: O contexto internacional das indignações mundiais (5/5)

Indignados e indignadas de todo o mundo: unamo-nos!

31 de Janeiro de 2012 por Eric Toussaint




É difícil prever o futuro da primavera árabe, do movimento dos indignados e de Occupy Wall Street.
As rebeliões na Tunísia e no Egipto podem resultar numa transição semelhante à da América Latina, das Filipinas ou da Coreia com o fim das ditaduras nos anos 1980, ou da África do Sul nos anos 1990, já para não falar dos Estados da África Subsaariana: estabilização de um regime burguês neoliberal. A época é outra, as características do mundo muçulmano são bastante específicas, os interesses geostratégicos pesam muito (em especial no que diz respeito ao Egipto e ao Médio Oriente; nem tanto no caso da Tunísia), a história é um processo aberto. A capacidade dos oprimidos para desenvolver a auto-organização será decisiva.

No que respeita ao movimento Occupy Wall Street e equivalentes no resto do território dos EUA, será que a fase actual de repressão, somada ao inverno, conseguirá pôr termo ao movimento? Será que as tentativas do Partido Democrático para fazer uma OPA ao Occupy Wall Street, na perspectiva das presidenciais de 2012, resultarão?

No que diz respeito ao movimento dos Indignados europeus, com excepção da Grécia, onde o movimento confronta directamente o governo, ficaremos atentos para ver se o movimento conseguirá consolidar-se na Espanha, ganhar força em Portugal, implantar-se na Itália, inaugurar-se na Irlanda e noutros países da Europa. Nos casos grego, espanhol e português, quando o movimento nasceu, os socialistas estavam no poder e governavam em proveito dos banqueiros responsáveis pela crise, aplicando políticas neoliberais. Posteriormente, a Direita ascendeu ao poder graças a eleições e estava decidida a impor uma cura de austeridade ainda mais brutal. Na Grécia, o regresso da Direita foi efectuado sem eleições, graças à nomeação de um governo de união nacional entre Pasok, a Direita e a extrema-direita. O contexto político foi alterado – conseguirá o movimento dos Indignados recobrar forças e entrar directamente em conflito com os governos? A resposta a estas questões será determinante para a capacidade de enfrentar o agravamento da crise. Sairá o povo irlandês do seu torpor? Nascerá um movimento dos Indignados irlandês? Os movimentos sociais italianos desempenharam um papel determinante no início dos anos 2000, aquando da ascensão da antiglobalização e do Fórum Social europeu e mundial. Seguiu-se um retrocesso, em certos casos, através duma adaptação à política social liberal praticada pelo governo de Romano Prodi e duma desmoralização provocada pelo regresso de Sílvio Berlusconi. O que irá acontecer com o governo de recurso de Mário Monti e a sujeição parcial da Itália à tutela da Comissão Europeia e do FMI? Conseguirá o movimento dos Indignados encontrar uma fórmula à italiana em 2012 ou a resistência passará por outras vias? Em França, que foi palco de um poderoso movimento social em 2010 pela defesa das pensões de reforma e que ficou à margem do movimento dos Indignados em 2011, será que este movimento conseguirá ganhar raízes quando a nova dose de austeridade for posta em prática, seja pela mão de Nicolas Sarkozy ou do socialista François Hollande? E o que dizer da Grã-Bretanha, Alemanha, Bélgica…? Se a crise dos bancos privados resultar em novas falências, à semelhança do que aconteceu com o banco franco-belga Dexia em outubro de 2011, qual será o efeito sobre as populações?

De qualquer forma, graças à primavera árabe, aos movimentos dos indignados e de Occupy Wall Street, o balanço de 2011 é claramente positivo para o movimento social em luta. Alguns povos livraram-se de ditaduras no Norte de África; nos EUA já não é o Tea Party que retém as atenções, mas sim Occupy Wall Street; em diversos países da Europa a resistência organiza-se em larga escala, enveredando por novos caminhos.

Uma coisa é certa: a questão da dívida constituirá cada vez mais a pedra angular do combate de resistência aos planos de austeridade e de desmantelamento dos direitos sociais adquiridos. O reembolso da dívida pública serve simultaneamente de pretexto para impor a austeridade e de poderoso mecanismo de transferência dos rendimentos das camadas mais baixas da população para as camadas mais altas (dos 99% em proveito do 1%). O combate para romper o círculo infernal da dívida é vital. Se não for assumido, restam poucas esperanças de conseguir vencer a próxima onda de ataques neoliberais. Além disso, em países como a Espanha e a Irlanda, onde o estouro da bolha imobiliária afectou centenas de milhares de famílias, a anulação da dívida hipotecária e a garantia do direito a uma habitação decente são questões centrais. Em diversos países (Grécia, França, Portugal, Espanha, Itália, Irlanda, nomeadamente), a criação de colectivos de auditoria cidadã da dívida constitui um passo em frente para reforçar a dinâmica do movimento dos Indignados onde este existe, e para passar à contra-ofensiva à escala europeia. Indignados e indignadas de todo o mundo: unamo-nos!


Traduccão: Rui Viana Pereira; Revisão: Noémie Josse Dos Santos

Eric Toussaint

docente na Universidade de Liège, é o porta-voz do CADTM Internacional.
É autor do livro Bancocratie, ADEN, Bruxelles, 2014,Procès d’un homme exemplaire, Editions Al Dante, Marseille, 2013; Un coup d’œil dans le rétroviseur. L’idéologie néolibérale des origines jusqu’à aujourd’hui, Le Cerisier, Mons, 2010. É coautor com Damien Millet do livro A Crise da Dívida, Auditar, Anular, Alternativa Política, Temas e Debates, Lisboa, 2013; La dette ou la vie, Aden/CADTM, Bruxelles, 2011.
Coordenou o trabalho da Comissão para a Verdade sobre a dívida pública, criada pela presidente do Parlamento grego. Esta comissão funcionou sob a alçada do Parlamento entre Abril e Outubro de 2015.

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