Argentina

Encerrados o 6º Encontro Internacional Ecossocialista e o 1º Encontro Ecossocialista da América Latina e do Caribe

23 de Maio de 2024 por Maria Elena Saludas


A cidade de Buenos Aires recebeu durante 3 dias (9, 10 e 11 de maio) aproximadamente 250 militantes vindos de 30 países diferentes. Depois de mais de um ano de preparação, nos reunimos no auditório da ATE (Associação dos Trabalhadores do Estado) para discutir e tentar pensar em estratégias para a resistência na batalha contra o sistema capitalista.



Como disse Michael Löwy, esse evento ecossocialista é «histórico». «Percebe-se que o eixo do ecossocialismo global está mudando do centro para a periferia... já que estamos enfrentando uma crise ecológica muito séria que afeta mais o Sul Global».

Estamos vendo isso agora mesmo no Brasil, na região do Rio Grande do Sul, com sua capital, Porto Alegre, inundada, com centenas de mortes, pessoas desaparecidas e perdas na casa dos milhões. Essa catástrofe está intimamente relacionada ao desmatamento na Amazônia (entre 2020 e 2021 a Amazônia brasileira perdeu 8712 km² de floresta), que causa o aquecimento global, solos que não absorvem. Isso é aprofundado nessa região pela substituição da biodiversidade por megaculturas de soja e megaprodução de gado. Incentivada pela bancada ruralista no Congresso Federal, conhecida como «Bancada do Boi», que trabalha para destruir a «legislação ambiental».

Vários temas foram debatidos durante esses dias intensos e entusiásticos. Eles começaram com o painel Histórias dos Encontros Internacionais Ecossocialistas com Juan Tortosa do SolidaritéS (Suíça), Alice Gato do Climáximo (Portugal), Iñaki Bárcenas do EH Gune Ecosozialista (País Basco) e a moderadora Vanesa Dourado do ATTAC Argentina. Os participantes destacaram a necessidade de «agir globalmente», que é preciso ter «um projeto para uma sociedade diferente do capitalismo» e, além disso, que a transição da indústria na Europa «não pode ser feita às custas da América Latina e do Caribe».

 

Houve vários workshops acontecendo em paralelo: Extrativismo no Cerrado brasileiro e a restrição hídrica, ou Debates ecomarxistas com Facundo Nahuel Martín, do CONICET Argentina, Iñaki Barcena, do EH Gune Ecosozialista, e moderados por Martina Eme Halpin, do Poder Popular.

 

Alem disto, no mesmo tempo, foi realizada uma oficina sobre Racismo Ambiental com as companheiras brasileiras Natália Chaves, co-vereadora da Banca Feminista de São Paulo, do PSOL, Nadja Carvalho, Secretaria de Relaciones Internacionales do PSOL e Gregorio Mejía, da Unión Sindical Obrera e da Central Unitária de Trabalhadores da Colômbia. Mejía denunciou que «sem água e comida, devido à contaminação do extrativismo, as pessoas são presas do trabalho do narcotráfico». Cháves disse: «A revolução será indígena e negra ou não será».

O almoço foi uma oportunidade de trocar opiniões e ideias que surgiram durante os diferentes workshops. Uma delas foi a de Evelyn Vallejos, de Catamarca, que disse que «veio com a intenção de contribuir para a construção de um programa comum e uma estratégia mundial com a qual possamos enfrentar a direita internacional».

As oficinas foram retomadas à tarde, uma delas tratando da realidade da situação contra a desapropriação: Espoliação de territórios e corpos, com a participação de Karina Navone do PSI (Argentina), Emilio Téllez do Sindicato Nacional del Bosque (México), María Eva Koustsovits da ATE Nacional (Argentina), Iñigo Antepara da EH Gune Ekosozialista (País Basco), Edid Escobar do Congreso de los Pueblos (Colômbia) e a participação virtual de Rafaela Pimentel do Territorio Doméstico (Espanha).

Simultaneamente, foi realizado o workshop Livre Comércio e Meio Ambiente: uma tensão insuperável no capitalismo? com Luciana Ghiotto do Transnational Institute e ATTAC Argentina, Pablo Solón da Assembleia Mundial pela Amazônia (Bolívia), Julio Gambina do CPI/ATTAC Argentina e Francisca Fernández Droguett do Movimiento por el Agua y los Territorios MAT e da Escuela Popular Campesina de Curaco de Vélez (Chile).

O workshop sobre Mudanças Climáticas e Militarismo, moderado por Juan Tortosa do SolidaritéS (Suíça) e com a participação de: Elsa Bruzzone do CEMIDA (Argentina), Tárzia Madeiros do Setorial Ecossocialista do PSOL (Brasil) e, virtualmente, Nick Buxton do Transnational Institute despertou muito interesse. Ele pode ser visto no YouTube:

 

Os workshops continuaram com uma sucessão de debates sobre Clima, Ciência e Ecossocialismo, com a participação de José Seoane do IEALC (UBA) na Argentina e João Camargo do Climáximo (Portugal), enquanto Alexandre Araújo Costa da Universidade Estadual do Ceará na Venezuela e Liliana Buitrago do Observatorio de Ecología Política na Venezuela participaram virtualmente.

Simultaneamente, o workshop sobre Dívida e Financeirização da Natureza foi realizado com María Elena Saludas do CADTM/ATTAC Argentina como moderadora e a participação de: Fernanda Gadea, da ATTAC Espanha, Éric Toussaint, porta-voz do CADTM Internacional, e Beverly Keene, membro do Diálogo 2000 e coordenadora do Jubileu Sul das Américas.

O workshop As Direitas e a Transição Ecossocia despertou grande interesse, com a participação dos deputados do PSOL Brasil Renato Roseno, do Ceará, e Flavio Serafini, do Rio de Janeiro, além de Claudio Katz, economista da Esquerda da Argentina (EDI), e Nadja Carvalho, Secretaria de Relaciones Internacionais do PSOL (Brasil). Katz sublinhou que: «Os cenários de catástrofe ambiental não têm solução dentro do capitalismo». Foi demonstrado que é impossível humanizar o capitalismo. Nesse sentido, Roseno explicou que «a lógica do capital sempre foi irracional, o socialismo é a única possibilidade de sobrevivência» e, portanto, «temos que recriar as formas políticas». «Um dos pilares da direita é a propaganda de valores conservadores sob a ideia de um passado melhor», ao que acrescentou: «Nossa derrota foi ideológica. A juventude marginalizada da periferia foi educada com valores reacionários. A contracultura foi cooptada pela direita». Serafini acrescentou outra reflexão sobre esse cenário: «Não podemos nos render à ideia de que o Twitter é liberdade, tem um dono por trás, é de direita e intervém no futuro político dos países».

 

Além disso, no período da tarde, foi apresentado o workshop sobre Lutas territoriais e criminalização, moderado por Germán Bernasconi do Poder Popular e com a participação de: Mariana Katz da Equipe de Povos Indígenas do SERPAJ (Argentina), Enzo Brizuela da Asamblea del Algarrobo (Andalgalá, Argentina), Silvina Álvarez da Mar Libre de Petroleras Red de Comunidades Costeras (Mar del Plata, Argentina), Evelyn Vallejos, da Unión de Trabajadores de la Economía Popular (UTEP) (Catamarca, Argentina), Matías Crespo, de Marabunta (Chubut, Argentina), Mauricio Cornaglia, da Marcha de los Barbijos de Rosario (Argentina) e da Asamblea Popular por el Agua (Mendoza, Argentina).

 

O dia terminou com um convite para assistir ao excelente documentário El Paraná: La Disputa por el Río no cinema Gaumont. O filme é de Alejo di Rissio e Franco González, que se aventuraram em uma jornada ao longo da bacia do Paraná para explorar a profunda realidade ribeirinha; ele discute projetos globais de exportação e até que ponto eles afetam pescadores, ilhéus e comunidades locais. Enfatizando a perda absoluta de soberania.

 

O último dia desse encontro crucial foi sábado, dia 11, com a transmissão ao vivo do painel O debate ecossocialista no centro e na periferia, com a participação de: Suelma Ribeiro, da Rede Brasileira de Ecossocialistas (Brasil), Jawad Moustakbal, da ATTAC Marrocos, e a presença virtual de Michael Lowy, da IV Internacional. O evento foi moderado por Arlindo Rodrigues, da Rede Brasileira de Ecossocialistas (Brasil). Lowy disse que «a mudança climática é a ponta mais dramática da crise ambiental, uma ameaça sem precedentes na história da humanidade». Ele acrescentou: «Somos passageiros de um trem suicida chamado civilização capitalista industrial moderna e a tarefa urgente é detê-lo. Essa é a revolução que temos de fazer».

 

Em seguida, foi a vez do workshop COP 30: Primeiro debate do encontro América Latina e do Caribe, moderado por Júlia Câmara, da Subverta PSOL (Brasil), e os palestrantes foram: Pablo Solón, da Assembleia Mundial pela Amazônia (Bolívia), Alice Gato, do Climáximo (Portugal), Arlindo Rodrigues, da Rede Brasileira de Eccossocialistas (Brasil) e Eduardo Giesen, do Grupo Iniciativa Ecossocialista (Chile). Solon disse: «Temos um consenso, ninguém acredita nos POPs. Portanto, temos que propor um acordo diferente do Acordo de Paris e seguir com ele». «Temos que fazer um acordo que nasça de um debate de e com comunidades e movimentos», propôs Rodrigues. Nesse sentido, Lexe indicou que «fazer uma contra-cúpula é aproveitar o fato de que o foco está lá e, a partir dos socialismos, temos que nos colocar na vanguarda». «Um contra-acordo é fundamental, mas tem de ser apoiado por uma ruptura ecossocialista. A COP deve ser impedida e rompida», alertou Alice Gato.

Após o almoço, teve início a oficina Soberania Alimentar: a agroecologia como prática política, moderada por Fernando González Cantero, do CONICET (Argentina) e com a participação de Perla Britez, da CONAMURI-Vía Campesina (Paraguai), da Federação Rural e de Damian Verzeñassi, do Instituto de Saúde Socioambiental. Após o workshop, Britez disse: «Na Via Campesina, dizemos que vamos globalizar a luta e a esperança porque a resistência é territorial, mas o capitalismo é global». Yanina Settembrino acrescentou que na Argentina «60 % do que as famílias consomem hoje é produzido pela agricultura familiar».

Ao mesmo tempo, foi realizado o workshop Energia e Capitalismo, moderado por Carla Isarrualde, da Organización 19 de Diciembre (Argentina). Os participantes foram Melisa Argento do Colectivo de Acción por la Justicia Ecosocial (CAJE) e da Asociación Argentina de Abogadxs Ambientalistas (Argentina), Nicolás Nuñez da Ambiente en Lucha e membro da Coordinadora BFS (Argentina). Nuñez advertiu que «longe de concordar com a hipótese de colapso, a crise ambiental não destruirá o capitalismo. Uma crise ambiental não destruirá o capitalismo; ele entrará em colapso graças à prática política de uma luta organizada». Bertalot explicou: «De certa forma, a história do capitalismo é a história do consumo de energia fóssil». «As energias renováveis dentro do capitalismo também são realizadas sob a regra do extrativismo de acumulação por desapropriação», continuou ele, acrescentando que, além da alienação dos trabalhadores em relação ao que eles produzem, «também poderíamos falar de uma alienação do fluxo de energia da produção graças à mecanização».

Em seguida, foram realizados dois workshops simultâneos. Um deles foi Ecofeminismos, moderado por Paula Delfino, de Marabunta (Argentina), e que contou com a participação de: Juana Antieco que é Kimelfe (educadora tradicional da comunidade Mapuche Tehuelche Newentuaiñ Inchin de Costa Lepa), Francisca Fernández Droguett do Movimiento por el Agua y los Territorios MAT e da Escuela Popular Campesina de Curaco de Vélez (Chile), Natália Chaves, co-conselheira da Banca Feminista de São Paulo do PSOL (Brasil), e Jessi Gentile, da Coordinadora de la Red Ecosocialista MST e membro da Coordinadora BFS (Argentina). Juana Antieco disse: «É fundamental passar da resistência à construção política». Droguett disse: «O ecofeminismo é para e das pessoas, não apenas das mulheres. Partimos de nossas próprias experiências de vida de opressão, mas lutamos pelas pessoas».

Analía Zárate do Observatorio Petrolero Sur - FOL (Argentina), Ariel Moreno, trabalhador do Secco PTS (Argentina) e Luján Rodriguez de Marabunta (Argentina) participaram do workshop sobre Perspectivas de classe para a transição energética. A moderação foi feita por Martín Álvarez, do Observatorio Petrolero Sur (Argentina). Zárate alertou: «Temos que pensar na transição energética com base nos interesses que estarão em jogo e em como vamos nos posicionar. Até o momento, não parece haver outro caminho que não seja o extrativismo». Nesse sentido, Moreno afirmou que «Estamos lutando para que a transição ande de mãos dadas com a nacionalização das empresas de energia, para que elas fiquem sob o controle dos trabalhadores».

Após longos e interessantes debates, foi a vez do último painel, intitulado Rumo a um grande movimento ecossocialista internacional. O painel foi moderado por Juan Tortosa, da SolidaritéS (Suíça), e contou com a participação de Vanessa Dourado, da ATTAC Argentina, Germán Bernasconi, do Poder Popular Argentina, Felipe Gutiérrez Ríos, da Marabunta e do Observatório Petrolífero Sul da Argentina, e Sébastien Brulez, da Gauche Anticapitaliste da Bélgica, este último representando aqueles que sediarão o próximo Encontro Ecossocialista Internacional, a ser realizado em 2026.

No painel de encerramento, Gutiérrez Ríos explicou que «o capitalismo gerou um conceito de meio ambiente que não tem história. E ele tem. A Pehuén (árvore sagrada da mitologia mapuche) de hoje não é a mesma de 500 anos atrás. Nós fazemos parte dessa natureza». «Não faz sentido estar no vagão do progressismo atual porque sabemos, e já foi demonstrado, que ele não serve para resolver o problema entre o capitalismo e a natureza», advertiu. «Pensar na prefiguração como um espaço de poder. Agroecologia, não como uma forma de alimentar minha família, mas como uma forma de alimentar toda a população», previu. Em seguida, foi a vez de Vanesa Dourado, da ATTAC Argentina, que falou sobre essa reunião: «Ficou claro que temos diferenças sobre como o socialismo deve ser hoje. Mas concordamos que somos uma ruptura, somos anticapitalistas». «Houve concordância de que os movimentos em luta, territoriais, são os locais de luta. É aí que poderemos vencer», disse ele. Brulez advertiu que «o SP europeu vem cumprindo a agenda capitalista junto com a direita», portanto «é necessário reinventar a esperança. Esse é o mundo ecossocialista». «As mudanças sistêmicas só acontecem com um movimento de massa, é assim que é», concluiu.

Nos despedimos, lembrando as palavras de Felipe Gutiérrez Ríos:
«Agora vamos voltar para nossos territórios e vamos nos reunir novamente, vamos voltar com triunfos da próxima vez. Vamos fazer nossas organizações crescerem, que os capitalistas se acautelem porque vamos nos reunir novamente e vamos continuar lutando onde quer que estejamos, em qualquer continente».


Tradução: Alain Geffrouais

Maria Elena Saludas

ATTAC/CADTM Argentina

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